A idéia do primeiro post deste ano era traçar algumas previsões para o mercado de vinhos. Assim como na política e no futebol, não tenho a menor idéia pra onde soprarão os ventos em 2018. Melhor então apontar a luneta para mais longe e observar as macro-tendências aqui e lá fora.

Neste ponto, o expert inglês Robert Joseph, nos traz alguns insights interessantes do seu último estudo ainda não publicado sobre o futuro do vinho, feito a partir de uma pesquisa com mais de 1.200 profissionais em todo o mundo. 

Clima preocupa e robôs já são uma realidade

O primeiro consenso é que as alterações no clima devem afetar o futuro da nossa indústria. Mais da metade dos entrevistados acredita que o clima terá um grande impacto no futuro do vinho. Um ponto ainda não tão bem antecipado, é que boa parte da mão-de-obra no vinhedo será substituída pela mecanização. Basta vermos os robôs podadores sendo utilizados em formato experimental na Nova Zelândia e EUA. Isso deverá afetar dramaticamente a produtividade e a estrutura de custos da indústria. 

Variedades, estilos e concorrentes

Não é de se surpreender que estudos como este tragam apostas de variedades que dominarão o futuro e que nunca se concretizam. A Riesling, por exemplo é a queridinha de 9 em cada 10 experts, e segue ignorada pela maioria dos consumidores regulares.

Mas há aqui algumas indicações interessantes, como a preferência por vinhos mais leves de variedades como Pinot Noir e Gamay que aparecem como "grandes apostas" para 44% dos entrevistados. E também os olhos atentos para os populosos mercados da China e da Índia. Joseph cita o sucesso da variedade Marselan, um cruzamento de Cabernet Sauvignon e Grenache, em um concurso chinês como uma possível estrela do futuro.

Ainda mais interessante é notar a atenção dos participantes para vinhos de menor graduação alcoólica e a futura concorrência esperada dos coquetéis e dos drinks sem álcool (Seedlip, um bom exemplo). Estas duas categorias são vistas como maior ameaça do que os destilados e cervejas artesanais - 37% vêem a cerveja como ameaça versus 48% para drinks sem álcool.

Nesta mesma linha, talvez possa surpreender os leitores, mas a cannabis também já é vista como futuro concorrente do vinho. Na California e em alguns outros estados dos EUA onde a droga já foi legalizada, gigantes da distribuição como Constellation e Southern Glazer's andam flertando com a possibilidade de incluírem a cannabis em seu portfolio. 

Mamãe youtuber substituirá Robert Parker?

Pela pesquisa, o futuro dos críticos não parece muito animador. Mais de 40% dos profissionais consultados esperam que a influência dos críticos diminua ou perca total relevância, versus apenas 4% que acreditam que o poder de influência dos Parker's, Jancis & cia aumente. Como comparação wine educators apareceram com 15%, jornalistas não especializados 12%, sommeliers 9% e atendentes de lojas 8%. Enoturismo (46%) e eventos (29%) também ganham relevância na comunicação, assim como mídias sociais em geral (49%). 

Por se tratar de uma pesquisa exclusivamente com o trade, talvez devêssemos ponderar estes números. Mas não é de se ignorar que o futuro da comunicação pareça estar se direcionando mais para instagrammers profissionais (apontado por 29% na pesquisa) e vídeo bloggers (25%) do que especialistas stricto sensu. Mais do que isso: os especialistas que quiserem permanecer vivos devem se adaptar às novas plataformas. Penso aqui comigo se não é chegada a hora da purple pages se repaginar? 

No Brasil a popularidade da imprensa especializada também não anda em alta. Pesquisa recente da consultoria inglesa Wine Intelligence com mais de 1.000 consumidores de vinho regulares em todo o país (Vinitrac, Nov 2017), apontou que 81% dos entrevistados considera a indicação de familiares e amigos importante no momento de escolher um vinho, contra apenas 54% a recomendação de críticos especializados. 

E não podemos esquecer da influência crescente dos algoritmos e da inteligência artificial em trazer sugestões assertivas de vinhos para cada tipo de consumidor. Spotify já faz isso muito bem com as músicas. Combinar essa ferramenta com a geolocalização é questão de pouco tempo.

A Amazon chegou ao vinho

O aumento do uso do smartphone é praticamente unânime entre os entrevistados (90%).  E 1/3 dos participantes acredita que tecnologias de scan and buy serão mais utilizadas. Neste sentido os principais beneficiados serão os e-commerce, a principal aposta de 34% dos participantes.

No entanto, aparece aqui um convidado pra festa ainda mais importante: a Amazon. Nas palavras de um especialista em marketing digital alemão: "O Google pode ser a principal ferramenta de pesquisa. Mas quando se fala em pesquisa de produtos e recomendações de clientes a Amazon é a número um disparada." Ainda nas palavras dele: "Muitos profissionais digitais já vêm redirecionado seus investimentos do Google Adwords para Amazon SEA. Essa tendência será ainda mais importante no mercado do vinho nos próximos 5 anos." E vejam que por aqui a Amazon já vem fincando seus pés de vez como um marketplace importante. Não será surpresa vermos vinhos por lá logo mais.

Finalmente, os carros autônomos devem ter um impacto significativo na opinião de 26% dos entrevistados, visto que as leis do uso de álcool na direção devem perder relevância e as portas que essa tecnologia abre para o enoturismo. 

Espero que ao final deste post você tenha informação mais útil do que saber que em ano eleitoral o dólar deverá estar mais instável e portanto o preço dos vinhos importados deve oscilar ... feliz 2018! 

Se ainda assim você sentiu falta de previsões mais concretas para este ano, recomendo a leitura do Boletim Winext#2 que segue mais atual do que nunca.


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A fonte principal deste artigo foi a reportagem The Future of the Wine Industry de Robert Joseph publicada na Meininger's Wine Business International. 

Fotos: Divulgação. Photo by Aaron Burden on Unsplash