Se você já se convenceu da importância do branding, tratado no post anterior, talvez seja útil listar aqui algumas reflexões sobre o que seria um bom processo de construção de marca no universo do vinho. As 7 reflexões abaixo vieram do artigo de Mike Paul Thoughts on the art of brand development e foram adaptadas à realidade do nosso mercado. 


Antes de mais nada, devemos levar em conta que cada produtor deve ser tratado individualmente dada a variedade de aspirações e capacidades de cada um nesse universo tão amplo. O mesmo vale para os diferentes grupos de consumidores e a forma de abordá-los. Se determinada região pode fazer enorme sentido para segmentos de vinhos de alta gama, para outros talvez seja irrelevante. Um grande colecionador de borgonha irá se interessar pelos pormenores de uma determinada safra ou das características de uma micro-região. Mas o que dizer do consumidor que quer apenas provar um bom vinho e está começando a apreciar Pinot Noir? 

Quando desenhamos um plano de marca nosso objetivo não deve ser apenas que ela seja atraente para o seu público-alvo, mas sim que se destaque na multidão. Afinal, a oferta de vinhos em geral não pára de crescer, apesar do consumo mundial declinante. Para quem se interessar em debruçar sobre o assunto do consumo e produção ao redor mundo, ver dados OIV

Dito isso, aqui vão algumas considerações importantes que todo gestor de marca deve ter em mente.

1. Defina o propósito da marca e os critérios de sucesso

Idealmente devemos ter claro alguns objetivos de curto e longo-prazo e uma estratégia clara para alcançá-los. É verdade que muitas marcas de sucesso surgiram de forma quase acidental  (Yellow Tail é um bom exemplo). Mas certamente existem muitas outras que nunca chegaram lá por não terem pensado a fundo sua razão de existir ou por simplesmente não terem um plano. Uma boa dose de sorte e timing correto são fatores importantes, mas um plano consistente reduzirá as chances de fracasso e criará uma boa base para uma evolução futura. 

2. A força do seu plano de marca dependerá do seu elemento mais fraco

Dê igual ênfase a todos os elementos do mix. Não coloque um vinho premium em uma apresentação pobre (quem já não viu isso?). Ou, de maneira mais ampla, de nada adianta criar uma grande marca em termos de estilo de produto, embalagem e apresentação, se a estratégia de comunicação e a estratégia de distribuição (route-to-market) não forem bem definidos. Pela experiência, esses são os dois pontos que mais falham.

3. Pense pequeno (pra depois pensar grande)

Poucas marcas de vinho precisam atingir a todos (seja o trade ou consumidor). A maioria das marcas, de fato, pode muito bem ignorar a opinião da maioria se tiverem o apoio de uma minoria de apaixonados.  

Mas o objetivo nunca deve ser de provocar uma reação de indiferença no trade (ou consumidor). Que pode ser traduzido por aquele suspiro do comprador, seguido de um pensamento em silêncio: "e aí?". Pelo número de marcas "e aí?" por toda a parte, podemos imaginar que muitos produtores não arriscam o suficiente com receio de receberem feedbacks negativos do mercado (e dos seus pares). Resultado: escolhem o caminho mais seguro e não agradam a ninguém.

4. Branding é fundamentalmente desenvolver e comunicar pontos de diferenciação e não pontos de similaridade

isso implica colocar em questão o seguinte: de quem você pretende se diferenciar? a quem o consumidor e o trade vêem como sendo seus competidores? qual o ponto de diferenciação da sua marca? por que o consumidor deve escolher a sua marca ao invés da do concorrente? Se a resposta não lhe vier de imediato, vale a pena voltar para o planejamento. E seria muito simplista assumir, como resposta, que seu vinho é melhor do que do seu concorrente.

5. O preço de lançamento deve lhe dar um retorno razoável

Antes do lançamento existem uma série de opções que dependerão da força dos seus diferenciais, do posicionamento da concorrência e, talvez, da influência da sua categoria/região. Mas uma vez no mercado, seu preço logo se tornará conhecido.

E quanto mais bem sucedido você for em determinada categoria de preço, mais difícil será de aumentá-lo. Produtores que lançam produtos com preço promocional com a esperança de subi-los uma vez que estejam conhecidos, correm o sério risco de fazerem besteira. 

Em resumo, se o seu preço de lançamento não te garante um retorno razoável, ele está errado.

6. A dificuldade para encontrar um bom nome geralmente é subestimada

Assumindo que não se trata de uma decisão óbvia (como de uma marca já existente), o processo de naming costuma ser mais complicado do que imaginamos, principalmente se considerarmos questões de registro.

Se você pretende vender em mais de um mercado, como é o caso da maioria das vinícolas, um nome pode funcionar em um país e não funcionar em outro. E é mais complexo encontrar um nome que possa ser registrado e seja atrativo em diferentes locais. Mais uma razão para se fazer um bom planejamento de marca.

7. Pragmatismo vs Perfeccionismo

Dificilmente você estará envolvido em um processo de planejamento de marca que não esteja comprometido pela falta de tempo. Nenhum plano é perfeito, ou baseado em informações perfeitas, enquanto o timing pode ser fator crítico de sucesso. Ou seja, não adianta passar um tempo indefinido no modo planejamento.

Espero a este ponto ter-lhe convencido da importância de um bom planejamento de marca. E que, ao fim, um bom gestor de marcas deve encontrar a melhor combinação entre perfeccionismo e pragmatismo. Fazendo um paralelo com a arte de produzir grandes vinhos e, por que não, a vida, a sabedoria está em encontrar esse equilíbrio.   


Nota: o texto de Mike Paul Thoughts on the art of brand development você encontra aqui.
Foto: Jeremy Thomas | unsplash

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